sábado, 2 de agosto de 2008

Capítulo 10 - Aurora - Parte 2

A angústia vinha, dando cambalhotas: Manuela começava a se sentir cada vez mais exposta ali, diante de Jóhann e Isadora — e o islandês prosseguia:
— Percebo agora, com saudável clareza, que realmente fizemos a escolha certa. É lógico que, ao mesmo tempo que todo ser humano é igual ao outro, cada um é diferente do outro ao mesmo tempo e, desse ponto de vista, Marina é uma garota inteligentíssima e nos ajudará nas investigações.
— Que investigações? — interrogou Cecília.
— Haha! Será que você não poderia ser um pouco mais paciente, minha jovem? Eu chegarei nesta parte. Aliás, já que não aguenta de tanta curiosidade, vou falar de você. Cecília: uma dama peculiar, mas que acaba soando quase como uma coadjuvante. Infelizmente. Mas você ainda terá incontáveis oportunidades para brilhar. Sua capacidade intelectual é elevada, convenhamos, você também nos auxiliará bastante daqui para frente. Luiz e Dante também estão no mesmo patamar, então, por enquanto, deixaremos para falar sobre ambos mais à frente. Agora, você — e apontou para Manuela —, você é tão importante quanto Marina. Você, bela Manuela, representa um item de imensa importância para nós, um item indispensável. Manuela... Você representa... A emoção humana.
Manuela corou. Todos a observavam com sorrisos gentis.
— C-como assim? — perguntou ela, timidamente.
— Você é um mar de sentimentos, Manuela. Você é uma estrada, uma estrada onde quem a percorre sente o mais dinâmico turbilhão de sensações. Dante que o diga. Soma-se isto com seus volúveis cabelos vermelhos e o que temos? Uma estrada vermelha. Uma sinuosa estrada vermelha. Imagino se neste mundo possa existir alguém que seja uma fusão do seu valor sentimental com o valor intelectual de Marina. Mas a existência de um ser desses é muito improvável.
Dante, inesperadamente, se levantou do sofá e, com tom desafiador na voz, disse:
— Você está errado! Manuela não é só uma "estrada vermelha de sentimentos"! Ela é tão ou mais sábia do que qualquer um aqui, pois ela tem a árdua tarefa de ter que lidar com seu potencial emocional. Todo mundo sabe que, quando se trata de sentimentos, a barra é indiscutivelmente pesada. Eu tenho certeza de que ela, de fato, concorda comigo, já que poucos param pra pensar sobre isso.
A garota olhou para ele com carinho. O coração de Dante disparou. Jóhann, rindo mais uma vez, argumentou:
— Parabéns pela audaz observação, senhor Dante, estou vendo que não vou poder subestimar nenhum de vocês aqui. Mas vamos parar com essa conversa assaz melosa e vamos começar a falar do que importa. Preciso que ouçam com atenção e seriedade. Eu vou falar sobre um acontecimento. Tal acontecimento está intrinsecamente relacionado à vocês cinco. Foi há nove anos atrás... Na manhã do dia 29 de Agosto de 1999, dia do aniversário de Marina, foi quando, pela primeira vez, por ordem de nosso diretor, Isadora e eu pusemos os pés em solo brasileiro. Imediatamente, sentimos o peso da diversidade deste país, mas não tínhamos tempo pra pensar à respeito. Tínhamos que nos concentrar numa certa pessoa que, digamos, se encaixaria como um sexto integrante no grupo de vocês, mas isso, na prática, era algo impossível de ocorrer, já que a morte dela serviu como ponto principal para que a relação que existe entre vocês nascesse; em outras palavras, se ela não tivesse morrido, vocês cinco não estariam juntos aqui hoje. Seu nome era Sara. Era uma garota encantadora, belíssima, com cabelos tão dourados que cheguei a entrar em êxtase quando a vi. Lá estava ela: sozinha em casa, abandonada pela família, deitada na cama de seu quarto esperando as energias voltarem. Ela tinha uma doença bastante incomum: sentia contrações emocionais e mentais em todas as ocorrências de sua vida que chegariam a estar relacionadas com seus sonhos posteriormente. Compreenderam? Não se tratavam de sonhos premonitórios, mas sim o contrário, através dessas contrações, ela poderia perceber com "quem" ou com "o quê" os seus sonhos seriam. Mas não era sempre assim, pois outros tipos de sonhos assolavam sua individualidade consciente. Eram sonhos sempre macabros ou tristes e, segundo ela, iam sugando cada vez mais as suas energias vitais. Tal síndrome (sim, acho que posso chamar de síndrome, não?) foi afastando lentamente as pessoas que estavam ao seu redor, até mesmo os próprios pais, que na realidade eram adotivos e não aguentavam mais viver naquela situação, já que as contrações da garota se tornavam cada vez mais freqüentes. No fim, o que restou foi somente ela com ela mesma, mais debilitada do que nunca, mas ainda assim era a coisa mais bela que eu já havia visto. Quando Isadora e eu entramos na humilde casa da garota sem ao menos bater na porta, ela não ficou surpresa. Parecia que nos esperava. Ela se sentou na cama e com muito esforço deu um sorriso incrivelmente meigo... Prosseguimos, explicando à ela o motivo de estarmos ali: iríamos acabar com as contrações e com os sonhos que a faziam sofrer. Sim, aquela era a nossa missão desde o início. De acordo com as informações dadas pelo nosso diretor, a única maneira de curá-la seria no momento em que encontrasse cinco pessoas específicas e sonhasse com todas elas de uma vez só. Se tal feito fosse realizado, ela acordaria no dia seguinte totalmente livre das tais contrações. O dia 29 de Agosto daquele ano, no entanto, era o melhor dia para a concretização da cura: estas cinco pessoas, na época, crianças, — como vocês já imaginam, são vocês cinco aqui presentes, Marina, Dante, Luiz, Manuela e Cecília — estariam juntas na sua festa de aniversário de nove anos, Marina, e, tendo conhecimento de tal fato, Isadora e eu nos posicionamos de modo a ir até a tal festa de aniversário, apresentar Sara às cinco crianças, ter as contrações, para que, finalmente, pudesse sonhar com elas e se livrar de sua doença. Lembro-me até hoje do inesquecível vestido que Isadora havia dado à Sara... Era branco, simples, mas tinha uma aparência leve, onírica... Ela parecia um anjo. Lá estávamos nós na festa. Deixamos Sara sentada numa confortável cadeira no vasto quintal gramado. Crianças e adultos corriam pra lá e pra cá. Pedimos que Sara observasse cada detalhe com atenção, para que pudesse visualisar as crianças o quanto antes. Teriam que ser cinco contrações, e a primeira veio logo, no momento exato em que Marina e sua mãe vieram em nossa direção. A cena foi chocante — você se lembra, Marina?
Marina, então, concentrando-se, lembrou-se de algumas cenas vagas:
— Sim, mas não há nada muito claro na minha mente. Só me lembro de uma correria, minha mãe me puxou para trás, gritando para que eu fosse ir brincar com as outras crianças. O resto é muito vago.
— Entendo. Bom, como eu poderia dizer, os efeitos das contrações eram desconhecidos por mim e por Isadora, e aquele momento, mesmo para nós, foi tão marcante quanto triste: quando Sara fixou os olhos em Marina, pude sentir os tremores dentro da garota. Ela lançou-se ao chão, colocando as mãos na cabeça, gritando e chorando com uma intensidade medonha. Eu, saindo de um inicial estado de perplexidade, abracei-a, tentando acalmá-la, sem muito sucesso. Só depois de cerca de quinze minutos que ela conseguiu se acalmar. E a cena voltou a se repetir mais três vezes. Faltava apenas mais uma. Nós esperamos, mas a quinta contração não veio, o que levou Isadora e eu a imaginarmos que ela poderia ter visto duas crianças ao mesmo tempo e tido duas contrações simultâneas. Resolvemos dar uma volta pelo quintal gramado para que Sara pudesse ver cada uma das crianças dali. Naquela hora, a nossa falta de onisciência foi crucial. À noite, enqüanto dormia e sonhava com apenas quatro de vocês, Sara morreu. Ou melhor: não acordou, pois, ao contrário do que vocês podem pensar, ela continua, até hoje, no mundo dos sonhos, esperando pelo dia em que a quinta criança aparecerá para, enfim, libertá-la.

5 comentários:

Anônimo disse...

Capítulo sensacional. O melhor até agora.

Anônimo disse...

uia, esse foi o melhor cap da FIC sem dúvida, e a história ganha um ótimo enredo

Anônimo disse...

Agora a história parece estar tomando um rumo muito bom.... Espero mais capítulos. (depois vc vai juntá-los e fazer um lívro?)

Anônimo disse...

Gostei desse capítulo, a garota Sara parece ser muito interessante, quero ver logo o que eles farão sobre essa "quinta criança" ^_^

Anônimo disse...

[i]HII desculpas, tava devendo!!
TA fikando cada vez mais emocionante!!
Quero ver como vai ser o desfecho!
tem ser tipo o ultimo livro do harry,ou do anime Kanon q quebro suas pernas..
Agora o seu mini livro tem q quebrar as nossas..^^