sábado, 31 de janeiro de 2009

Capítulo 15 - Amor

O nariz de Manuela coçou levemente quando o avião aterrissava numa extensa superfície plana. O cheiro do ar era outro. Depois de Leon, Isadora, Jóhann e dois dos quatro agentes, Manuela foi a primeira dos jovens a desembarcar; e o que viu, do lado de fora, se não era assustador, pelo menos causava alguma inquietação: era um estádio de futebol - o Amsterdam ArenA. Perfeito, único.
— Vocês sabem que horas são? — indagou Leon, após todos se encontrarem do lado de fora do pequeno avião.
Ninguém respondeu.
— São onze da manhã, do dia 16 de Agosto. Talvez alguns se surpreendam com a inimaginável aterrissagem dentro deste belíssimo estádio, mas creio que já conheçam as nossas capacidades sobrehumanas o suficiente para que eu me sinta confortável para poder me privar de quaisquer explicações. — deu um sorriso torto, virou-se — Sigam-me. — disse, por fim.
Foi caminhando vivazmente na direção de um dos vestuários, os outros o seguiam. O sol estava relaxante no seu calor, refrescante, batendo na testa de Manuela. Mas, de repente, ela rapou.
— Dante! — chamou ela.
O rapaz se virou imediatamente, olhando com profundidade nos olhos azuis da garota, a feição confusa mas séria.
— Que foi? — perguntou.
— Olhe — ela apontou para uma direção indefinida, para o alto, talvez para o céu.
— O que está vendo? — perguntou o garoto, curioso.
— O céu. Você se lembra?
Ele levantou a cabeça mais uma vez, deixando-se observar longamente o céu azul-claro com poucas nuvens — eram poucas mas havia um punhado encobrindo parte da luz solar... Um punhado de nuvens cinzentas, carregadas. Só aquele punhado.
— Como eu conseguiria esquecer, Manuela? Como eu poderia?
E encarou-a com um sorriso bondoso na face. Ela retribuiu o sorriso, dizendo:
— Você... é especial pra mim, Dante. Mais do que eu poderia imaginar. Me desculpe por aquele dia. Talvez você seja a única pessoa que realmente me compreende. Acho que eu estava errada.
Dante segurou as mãos dela com certa firmeza, dessa vez com um olhar sério e intimidador.
— Manuela, você entende, não é mesmo? Desde aquele dia, o dia em que o céu estava assim, o dia em que nos conhecemos... Você sempre foi a coisa mais importante pra mim. Mais do que tudo. Tudo, Manuela.
Seus rostos ficaram muito próximos. As respirações misturavam-se. Nervosismo, corações disparando. Sorrisos e olhares de encanto. Ali, no meio do Amsterdam ArenA, na frente de todos, os lábios deles se tocaram gentilmente, depois se separaram e voltaram a se tocar uma última vez.
— Eu te amo. — disse Dante, dessa vez com uma expressão rara de extrema felicidade.
— Eu também. Sempre. — sussurrou Manuela, com ternura.
E, dessa vez de mãos dadas, correram para acompanharem os outros que seguiam Leon.
Cecília estava próxima e vira a cena; seu coração doía: inevitavelmente, o que sentia pela amiga era algo maior do que uma simples atração física. Havia o sentimento do amor relacionado à amizade em si, claro, mas existia algo mais. Um outro amor, diferente.
— Eu ainda vou... lutar por ela! — pensou, quase falando.
Leon se aproximava da entrada de um dos vestuários, o grupo o seguia com interesse. Ele abriu a porta dupla e ficou para na frente da mesma, virando-se para os outros.
— Isadora, Jóhann, Ivan, Lafaiete e Julian, vocês entrarão comigo. Henry, você pode ir com os jovens, mostre-os um pouco do que é Amsterdã. Mas tomem cuidado, acima de tudo.
Sorriu como um velho enrugado e, de alguma forma, ele era exatamente isso.
— Ok, senhor Leon. — respondeu Henry com convicção.
Henry era um assistente bastante útil. Velocidade e destreza eram as características que mais o favoreciam e acabavam contribuindo para a sua ascensão na Agência Eve. Sua aparência, no entanto, era consideravelmente duvidosa: o rosto espinhento, os longos cabelos ondulados, amarrados em um rabo de cavalo, e o corpo jovem e musculoso o faziam aparentar, no máximo, uns 25 anos de idade, mas era impossível ter certeza, afinal, ele também não deveria ser um ser humano comum, apesar de também não chegar nem perto de ser nenhum deus — não que Isadora, Jóhann e Leon fossem isso em suas essências.
Depois que os "convocados" de Leon adentraram no vestuário, Henry se virou para os jovens com um largo e forçado sorriso no rosto.
— É... parece que eu vou ser a babá de vocês hoje.
Ninguém riu. Os cinco o seguiram até o saída do estádio Amsterdam ArenA.
Do lado de fora, havia outro mundo. Amsterdã, uma cidade aquática, a Veneza do Norte, como diziam. As construções eram de cores diversas, nada fora do comum, mas o cheio da água era captável em qualquer ponto dali. A aparência era inovadora, mas... as pessoas e as sensações eram literalmente variadas.
— Então — começou Henry — Pra onde vão querer ir primeiro?
Dante fez uma cara irônica e disse:
— Ué... eu pensei que você fosse o nosso guia. Talvez você não tenha percebido ainda, mas nunca viemos aqui antes. Comecemos por onde você achar melhor.
O assistente coçou a cabeça com a mão esquerda, encarando Dante friamente. Depois sorriu, quase imperceptivelmente.
— Você está certo, rapazinho. Eu sou meio desatento mesmo! — riu de si mesmo, com muito mais tranquilidade agora — Vamos à um coffee shop então. Isso é o que não falta por aqui.
Mas não ia ser exatamente isso o que ia acontecer.
— Espere — falou Luiz, para a surpresa de todos — Eu tive uma idéia.
Todos fitaram o garoto cabeludo, atônitos.
— E o que você sugere, Luizinho? — perguntou Henry, com sarcasmo.
Luiz sorriu mais sarcasticamente ainda, e falou:
— Eu acredito sinceramente que... a maioria de nós quer fazer um tour pela cidade por conta própria. Você não precisa ser nossa babá, ninguém aqui é uma criancinha. Que tal cada um ir para onde quiser, e nos encontramos aqui mesmo, daqui a uma hora?
— Eu concordo! — exclamou Marina, entusiasmada.
— Eu também! — dessa vez foi Cecília quem assentiu.
Henry olhou para Dante e Manuela pelo canto do olho.
— Vocês? — perguntou ele.
Os dois balançaram a cabeça positivamente.
Com um fechar de olhos e um suspiro que significava indiferença, Henry parecia ter admitido a desejada derrota.
— Bom, então, que seja. Para mim não mudará muita coisa. Tomem, virem-se com esses duzentos euros. Eu queria dar uma passada pelo Red Light District mesmo, e é bem melhor ir sem vocês — riu para si — Só tenham certeza de decorarem o caminho de volta. É fácil se perder em qualquer lugar do mundo que nos é desconhecido. Até.
E saiu andando velozmente, com passos de alívio, por ter se livrado da responsabilidade de ter que tomar conta dos jovens, mesmo que tivesse sido um pedido de Leon. "Ele não vai se importar", pensou Henry.
Ainda parados em frente ao ArenA, os cinco se entreolhavam com inquietação.
Luiz quebrou os olhares:
— Acho que vou comer alguma coisa. Estou faminto. Quem topa?
Marina foi a primeira, seguida pelos outros três — mas, de imediato, Luiz pôs a mão direita no ombro de Dante e disse baixinho, de modo que só ele pudesse ouvir:
— Eu levo Cecília e Marina para poder deixar você e a Manuela mais à vontade. Vá em frente. Tenha uma boa conversa com ela. Termine de pegar de volta aquilo que sempre foi seu.
Dante quase riu da sutileza machista da última frase, mas concordou com a idéia.
— Obrigado. — falou.
Um instante depois, Luiz agarrou Marina e Cecília pelas cinturas e levou-as consigo.
— Vamos, vamos garotas! As cores da Veneza do Norte nos esperam! Vamos vagar por aí...!
— Espere... e os dois? — questionou Cecília, confusa e enciumada.
— Eles precisam desse tempo. Sozinhos.
Cecília, sentindo um aperto devastador no peito, olhava, ainda a uma certa distância, Dante e Manuela, parados como duas estátuas, os olhos dele nos dela: amavam-se em silêncio. E não havia nada que Cecília pudesse fazer. Eles se mereciam, se completavam; isso era inegável.
— Está com fome? — perguntou Dante à garota dos cabelos vermelhos.
— Sim. Muita. — disse ela, sorrindo perspicazmente.
Seguiram, então, na direção oposta da que Luiz e as garotas haviam tomado. Pararam na frente de um restaurante aparentemente não tão simples, mas também não tão espalhafatoso.
— Este parece um bom lugar. — comentou Dante, alegre.
Entraram — Manuela fez questão de escolher uma das mesas mais afastadas. Um garçom logo veio atendê-los — entregou dois cardápios sem dizer palavra alguma.
— O que vai querer? — interrogou Dante, a cabeça inclinada na direção do cardápio, mas com os olhos grudados em Manuela.
— Eu pensei em alguma coisa mais caseira e suculenta. Mas aqui tem muita coisa! — exclamou ela, colocando as duas mãos na cabeça e rindo — Não consigo escolher!
Dante acenou com a mão, chamando o garçom.
O homem, vendo que Manuela e Dante eram estrangeiros, pôs-se a falar em inglês.
— What can I do for you?
Dante tinha um inglês razoável, então, disse:
— Can you... bring me two sandwiches and two cokes, please?
— Of course. What you want in the sandwich?
— Well... I don't know, just bring me what you think was the best sandwich. Ok?
— Fine. I will.
O homem se virou, indo providenciar o pedido.
Manuela encarou Dante com olhos penetrantes.
— Seu inglês não é dos piores. — disse ela, ironicamente.
— Obrigado. Eu não fiz nenhum curso, nem nada... Acho que está razoável.
— De fato.
Trocaram sorrisos bobos e desviaram o olhar. O silêncio perdurou por um tempo, como se um estivesse tentando ler os pensamentos do outro. Quando olharam-se de volta, já pareciam ter tirado suas conclusões com relação ao que iriam dizer a seguir.
— Manuela, eu... — começou Dante, praticamente sussurando; sua boca tremia. Segurou as mãos de Manuela, acariciando-as.
Ela olhou pra ele, em dúvida, a interrogação formada na face.
— Estou ouvindo. — disse ela, ligeiramente apreensiva.
Dante suspirou profundamente e começou a discorrer:
— Naquele dia, Manu... no dia em que nós dois brigamos no ônibus. Uma coisa aconteceu, logo depois de você descer.
E fez mais uma pausa. Olhou para ela com olhos tristes.
— O que aconteceu, Dante? Pode me contar. Você confia em mim ou não?
— Eu penso que sim... afinal, você é a pessoa mais importante do mundo pra mim.
— Você tem o mesmo significado pra mim, Dante. Não importa o que seja, você não tem porquê me esconder algo.
Do lado de fora, uma garoa mansa caía, muda, sobre a cidade. Era um dia sombrio, mas... romântico, sensual, nostálgico. Havia uma beleza visceral dominando Amsterdã.
— A minha comodidade me impedia de falar, Manu. Um segundo depois de você descer do ônibus, meu pai apareceu. Apertou meu ombro, dizendo que queria conversar.
A garota arregalou os olhos, claramente surpresa.
— Seu pai? E o que vocês conversaram?
— Ele queria que eu ajudasse a inocentá-lo. Inocentá-lo pela morte da minha mãe, Manu! — de repente, via-se a fúria em seu rosto — Aquele desgraçado! Eu... eu... ele tentou me matar e...
— E o quê?
— Eu o matei.
Quando Dante terminou de proferir aquelas palavras, o garçom havia chegado à mesa, servindo os dois refrigerantes.
Here. The cokes. I'll come back to get the sandwiches.
— Ok. Thanks. — murmurou Dante, cabisbaixo, dando uma longa golada na coca.
Manuela coçou o nariz perfeito com a mão esquerda. Seus olhos, agora mergulhados em alguma dimensão profunda, mostravam que ela raciocinava intensamente sobre algo. Ao coçar o nariz novamente, dessa vez com a mão direita, disse:
— Isso faz de você um assassino, Dante.
Ele concordou com a cabeça, razoavelmente surpreso pelas palavras dela, soltando um leve suspiro, sem olhar para a garota.
— Mas — continuou ela —, mesmo que você não vá para o Céu — deu uma risadinha impura —, você teve um motivo considerável para fazer o que fez. Matar alguém não é uma coisa boa, mas... tem horas que não existe outra saída — isto é, a não ser que você quisesse ser morto por ele. Você lutou pela sua vida, Dante. Eu respeito isso, e admiro. O que eu sinto por você agora chegou a um ponto em que... é bastante difícil, se não impossível, de sofrer modificações, por qualquer motivo que seja.
Ela levantou a cabeça dele: lágrimas inundavam-lhe o rosto.
— Obrigado — disse ele, as lágrimas despencando mais ainda.
Erguendo-se sutilmente da cadeira, Manuela beijou os lábios de Dante com extrema doçura.
Mas, então, algo ocorreu. De repente um mundo escuro surgiu, e Dante e Manuela não puderam reconhecer mais nada, salvo uma voz etérea que, ao fundo, sussurrava: O amor... não existe.

10 comentários:

Anônimo disse...

tah lindo o cáp *=*

Anônimo disse...

achei foda o capítulo.. sei la.. eu pensei que eles iam chegar em Amsterdã parecendo X-men indo pra missao

mas.. achei bem legal.. e nao entendi merda nenhuma do final, gostei do rumo que as relações deles estao tomando.. e achei o Henry muito foda. xD

Anônimo disse...

Muito bom. Mesmo.

Anônimo disse...

Nossa, capitulo fodão *-*
quero saber o reesto \o/
Ps: henry FDP, curti ele non..¬¬

Anônimo disse...

só pq ele queria fumar uma maconha.... e pegar umas putas? na Holanda pode Deh... ^^

Alan Luiz disse...

Valeu Math, valeu Déh...
E, ah, tinha um errinho no final do capítulo...
Na parte do "Obrigado", quem fala é o Dante e não a Manuela (eu tinha colocado "disse ela" e não "disse ele")

Sorry. =/

Anônimo disse...

Capítulo realmente muito bom, um dos melhores, e pelo jeito o caso do dante e da Muela.... não rolou =/

Anônimo disse...
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Anônimo disse...
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Anônimo disse...

Também gostei dele (Henry) xDDDD
Achei muito legal o final, suspense manerão